segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Aprendizagem motora: feedback

Outro fator importante que auxilia o processo de aquisição de habilidades motoras é o feedback. O feedback nada mais é do que o conjunto de informações percebidas pelo aluno/atleta sobre o seu desempenho durante e após a prática. A família do feedback é composta pelos feedback intrínseco e extrínseco. O feedback interno ou intrínseco diz respeito às informações captadas pelo aluno durante ou após o desempenho da habilidade por meio dos sistemas exteroceptivos e proprioceptivos como a visão, o tato, a audição, a propriocepção etc. Já o feedback extrínseco ou aumentado consiste em informações fornecidas por um agente externo, por exemplo, o professor. 

Em estágios iniciais de aprendizagem, principalmente no estágio associativo, os alunos já conseguem identificar o erro na execução da habilidade motora, porém não sabem o que fazer para solucioná-lo, e por isso, o fornecimento de feedback externo é de suma importância.  O feedback externo pode ser fornecido de duas formas: por meio do conhecimento de resultado (CR) ou conhecimento de performance (CP). O CR consiste em fornecer informações sobre o alcance da meta ambiental da tarefa, por exemplo, "você acertou o saque", " você errou o saque", " o saque caiu na posição 5" etc. Já o CP consiste em fornecer informações sobre o padrão de movimento, por exemplo, "segure a bola à frente e na altura do quadril para sacar". Ele tem como principais funções: informar sobre o desempenho da habilidade motora (feedback negativo: descrição do erro e prescrição de soluções, diminuição do erro. Ex: “a bola bateu na sua mão ao invés de bater no antebraço, deixe o braço esticado e contate a bola com o antebraço na manchete”) e/ou motivar os alunos a praticar determinada habilidade motora (feedback positivo: elogios, reforço positivo, reconhecimento dos acertos do aluno. Ex: “bom saque”).

Em relação à frequência de feedbacks, um número reduzido e distribuído ao longo da prática parece favorecer a aprendizagem, pois o excesso do mesmo faz com que o aluno se torne dependente dele e não desenvolva os mecanismos de detecção e correção do erro durante a prática. Nesse sentido, o feedback emitido pelo professor deve complementar a avaliação de desempenho feita pelo aluno (feedback interno), e não substituí-la. Algumas estratégias que o professor pode utilizar para diminuir a frequência de feedbacks são: estabelecer uma frequência relativa e/ou uma faixa de amplitude. A frequência relativa consiste em determinar um percentual de feedbacks a serem fornecidos durante a prática (por exemplo, 50%: a cada duas tentativas é fornecido um feedback; 33%: a cada três tentativas é fornecido um feedback). Já a faixa de amplitude consiste em estipular uma faixa de tolerância ao erro (UGRINOWITSCH et al, 2011). Nesse caso, se o desempenho do aluno está dentro da faixa, é considerado um acerto, mesmo que o desempenho não tenho sido totalmente correto. Nessas condições, o feedback não é fornecido ao aluno, mas ele sabe previamente que a ausência dessa informação significa um acerto. Por exemplo, no saque por baixo, o professor estipula que os alunos devem segurar a bola na altura do quadril. Se ele percebe que um aluno está segurando a bola um pouco acima da altura e a faixa de amplitude estipulada for ampla (mais tolerante), ele não fornece feedback. Porém, se a faixa estipulada for estreita (pouco tolerante), ele imediatamente fornece CP. Após os alunos realizarem a execução esperada do componente e estarem dentro da faixa, o feedback não é mais fornecido e os alunos interpretam a ausência de informação nas próximas tentativas como acerto na execução do movimento. Faixas mais amplas nos estágios iniciais de aprendizagem são mais favoráveis para a aprendizagem, enquanto que em estágios mais avançados, faxias estreitas (pouca tolerância ao erro) são mais recomendadas.

Espero que este post tenha te ajudado a refletir sobre o feedback e que você possa aplicar esses conhecimentos na sua prática.

Até mais!


REFERÊNCIAS

UGRINOWITSCH, Herbert; FONSECA, Fabiano de Souza; FLÁVIA, Maria; PINTO, Soares; LEANDRO, Vitor; BENDA, Rodolfo Novellino. Efeitos de faixas de amplitude de CP na aprendizagem do saque tipo tênis do voleibol. Motriz, Rio Claro, v.17, n.1, p.82-92, jan./mar. 2011


sexta-feira, 6 de novembro de 2020

Aprendizagem motora: estabelecimento de metas

Após instruir os alunos sobre a tarefa, é necessário que o professor estabeleça metas ou critérios de êxito para balizar e avaliar o desempenho dos alunos na aula/treino. O estabelecimento de critérios claros e específicos pode promover a aprendizagem à medida que os alunos atingem as metas e se engajam na prática (TANI et al, 2004). O sistema de accountability (responsabilização) possibilita que os alunos prestem contas sobre o seu desempenho e se motivem para melhorar sua performance.

As metas devem ser específicas, atingíveis, realistas, e de preferência de curto prazo. Metas inalcançáveis podem desestimular os alunos e ser prejudicial para o processo de aprendizagem. Elas também devem variar conforme o nível de habilidade dos alunos e o objetivo estabelecido para a sessão de treino, podendo ser de processo (realização do movimento - ex: entrar embaixo da bola no toque), produto (resultado do movimento - ex: realizar 10 saques direcionados para a posição 1) ou de resultado (aplicação dos movimentos em situação de jogo - ex: vencer o rally no side-out). 

Pensando em um processo de aprendizagem do voleibol, metas e critérios de êxito relacionados realização do movimento (processo/eficiência) e ao resultado do movimento (produto/eficácia) podem ser predominantes nas etapas iniciais visto que, geralmente, as habilidades motoras básicas e os fundamentos do voleibol são os principais conteúdos a serem aprendidos. Contudo, é importante levar em consideração que nem todo aspecto relacionado a eficiência da técnica é imprescindível para se obter êxito no jogo (MESQUITA et al, 2001). A aprendizagem da técnica deve estar orientada à eficácia em situação de jogoApós os alunos assimilarem os aspectos relacionados à eficiência e eficácia das habilidades motoras básicas e fundamentos, critérios de êxito relacionados a aplicação em situação de jogo podem ser introduzidos de forma gradual visto que o problema agora é solucionar os problemas relacionados às ações de jogo (saque, passe/recepção, levantamento, ataque, bloqueio, defesa, contra ataque etc).

Por fim, é importante salientar que os diferentes tipos de metas e  critérios de êxito podem ser utilizados em qualquer etapa de aprendizagem, desde que eles estejam condizentes com o nível de aprendizagem dos alunos e com os objetivos do professor/treinador. 

Espero que esse post tenha te ajudado.

Até uma próxima!
 
REFERÊNCIAS
MESQUITA, Isabel; MARQUES, António; MAIA, José. A relação entre a eficiência e a eficácia no domínio das habilidades técnicas em Voleibol. Revista Portuguesa de Ciências do Desporto, 2001, vol. 1, nº 3 [33–39].
TANI, Go; FREUDENHEIM, Andréa Michele; MEIRA JR, Cássio de Miranda; Corrêa, Umberto Cesar. Aprendizagem motora: tendências , perspectivas e aplicações. Revista Paulista de Educação Física, São Paulo, v.18, p.55-72, ago. 2004.

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Aprendizagem motora: instrução verbal e demonstração

Ao propor determinada tarefa em uma aula/treino, o professor/técnico deve oferecer instrução prévia à prática, ou seja, fornecer informações aos alunos sobre a tarefa a ser realizada. Isso envolve explicar os objetivos da tarefa, organizar os alunos em quadra, especificar o que será feito, como será feito etc. 

A instrução prévia à prática pode ser realizada de duas formas: por meio da instrução verbal e/ou demonstração (UGRINOWITSCH & BENDA, 2011). A instrução verbal consiste em fornecer informações verbais sobre os aspectos da tarefa, por exemplo, dizer aos alunos "vocês vão realizar um saque e depois entrar na quadra para defender um ataque". 
A instrução não deve ser demasiadamente longa e cheia de informações, por isso, uma forma interessante de instruir verbalmente é utilizar dicas verbais. As dicas verbais nada mais são do que frases ou expressões curtas e objetivas que resumem as informações relacionadas à tarefa, por exemplo, "passa e abre pra atacar, "saca e entra na quadra" etc. Elas têm como intuito condensar as informações e dirigir a atenção dos alunos para os aspectos específicos e essenciais da tarefa. A demonstração, por sua vez, consiste em apresentar aos alunos um modelo executando a tarefa  (professor, aluno, vídeo etc). Esse tipo de instrução possibilita a formação de um plano de ação e serve como uma referência cognitiva ao aluno para a detecção e correção do erro durante a prática.

A associação entre a demonstração e a instrução verbal parece ser mais efetiva para a aquisição de habilidades motoras. A instrução verbal, apesar de contemplar o objetivo e a especificação da tarefa, não fornece um modelo de execução (como fazer). Nesse sentido, a demonstração supre essa demanda oferecendo uma imagem da execução completa ou parcial do movimento, e favorece a compreensão do objetivo da tarefa e o meio para alcançá-lo. Por exemplo, o professor, ao demonstrar o movimento da cortada, pode fornecer dicas verbais como "encaixe a mão na bola" ou "golpeie a bola no ponto mais alto" para dirigir a atenção dos alunos a componentes específicos da tarefa de acordo com os objetivos estipulados para a sessão de treino.

Em estágios iniciais da aprendizagem, as instruções sobre o padrão de movimento podem ser predominantes, enquanto que as informações sobre o resultado do movimento podem ser focadas em estágios mais avançados (CORRÊA et al, 2017). Nas etapas iniciais, os alunos estão formando uma estrutura (programa motor), e por isso necessitam uma referência cognitiva da execução da habilidade. Já nas etapas mais avançadas, o programas motor já está formado e agora o objetivo é relacionar a execução da habilidade motora com o resultado do movimento no ambiente.

Espero que esse post tenha te ajudado.

Até uma próxima!

REFERÊNCIAS

CORRÊA, Umberto Cesar; OLIVEIRA, Jorge Alberto De; TANI, Go. 40 anos da Pós-graduação da EEFE-USP : a sua contribuição para o avanço do conhecimento sobre o comportamento motor humano. Rev Bras Educ Fís Esporte, (São Paulo). 2017 Ago; 31(N esp):97-110.

UGRINOWITSCH, HerbertBENDA, Rodolfo Novellino. Contribuições da Aprendizagem Motora: a prática na intervenção em Educação Física. Rev. bras. Educ. Fís. Esporte, São Paulo, v.25, p.25-35, dez. 2011.