A aprendizagem motora é um campo de investigação da área do comportamento motor que estuda os mecanismos e processos subjacentes à aquisição de habilidades motoras e os fatores que auxiliam esses processos. Os conhecimentos produzidos nesse campo fornecem subsídios aos treinadores esportivos para orientar ações e estimular novas ideias e hipóteses operacionais na intervenção profissional.
Na área do comportamento motor, duas perspectivas teóricas têm se destacado: a teoria motora e a teoria da ação (TANI et al, 2010). A teoria motora tem se preocupado em investigar os processos de armazenamento e processamento de informações na memória em forma de representações centrais e abstratas de movimento. Do ponto de vista dessa teoria, o controle de movimentos e a aquisição de habilidades motoras ocorrem por meio da estruturação de representações internas de movimento no cérebro (sistema nervoso central) que geram mudanças relativamente permanentes nas capacidades de movimento de um indivíduo. Um movimento é resultado de mecanismos internos de identificação de estímulos, processamento de informações, programação e execução motora. Já a teoria da ação tem se preocupado em investigar a relação entre o indivíduo e o ambiente no controle e produção de movimentos. Nessa teoria, o controle motor e a aquisição de habilidades motoras ocorrem por meio do estabelecimento de uma relação funcional entre o indivíduo e o ambiente, sem a necessidade de intermediação por parte de representações do SNC. Os padrões coordenativos de movimento emergem para suprir os constrangimentos presentes no contexto de performance (ambiente).
As teorias clássicas de aprendizagem motora explicam o processo de aprendizagem apenas até a automatização da habilidade motora. Contudo, a aprendizagem parece não se findar com a automatização. Um modelo recente de aprendizagem motora, que engloba conceitos de ambas as teorias citadas anteriormente, tem sido proposto nos últimos anos: o modelo adaptativo de aprendizagem motora. A partir de conceitos como a visão de sistemas dinâmicos e a noção de representação central abstrata, o modelo propõe a existência de um programa de ação organizado hierarquicamente, composto por uma macroestrutura (responsável pela consistência) e uma microestrutura (responsável pela flexibilidade). A microestrutura diz respeito aos componentes da habilidade e a macroestrutura refere-se ao padrão que emerge da interação entre esses componentes. O tempo total, a força total e a seleção de músculos de uma habilidade são exemplos de aspectos variantes relacionados à microestrutura, enquanto que o sequenciamento, o tempo relativo e a força relativa são aspectos invariantes relacionados a macroestrutura. Exemplificando, na cortada do voleibol, a sequência do movimento não varia (corrida de aproximação, passada de ataque, salto, golpe na bola e queda), o que varia em sua execução é o tempo total do movimento, os músculos acionados e a força empregada dependendo das circunstâncias do ambiente (o tipo de levantamento, a altura da bola, a velocidade da bola, a distância da bola em relação à rede etc). Nesse modelo, a aprendizagem motora é caracterizada como um processo contínuo de estabilização-adaptação-estabilização. Na fase de estabilização ocorre um aumento da consistência da habilidade devido à eliminação do erro por meio do feedback negativo. Os movimentos atingem uma padronização espaço-temporal e se tornam mais consistentes e coordenados, formando uma estrutura (macroestrutura). Já na fase de adaptação, ocorrem ajustes no sistema devido às perturbações tanto do ambiente (ex: estímulos externos que exigem uma resposta) quanto do próprio sistema (ex: a intenção do próprio executante em executar a habilidade de outra forma). Essa adaptação pode ocorrer pela flexibilidade inerente à estrutura adquirida, ou seja, pela mudança de parâmetros do movimento (microestrutura), pela reorganização da própria estrutura (macroestrutura), ou pela emergência de uma estrutura completamente nova (auto-organização).
No campo da aprendizagem motora, é de amplo conhecimento da comunidade científica a existência de fatores que auxiliam o processo de aquisição de habilidades motoras. São alguns deles: a instrução prévia à prática, o estabelecimento de metas, o feedback, e a prática propriamente dita (UGRINOWITSCH & BENDA, 2011). Ao propor determinada tarefa em uma aula/treino, o professor deve optar se a prática será constante ou aleatória, pelo todo ou pelas partes, massificada ou distribuída, fornecer instruções verbais e/ou demonstrações, estabelecer metas ou critérios de êxito para que os alunos possam balizar seu desempenho e fornecer feedback durante e após a prática para ajudar os alunos a alcançar a meta. São muitos os fatores que os professores podem organizar e controlar em suas intervenções. Nos próximos posts, vamos detalhar mais cada um deles.
Até uma próxima!
REFERÊNCIAS
TANI, Go; TADEU, Jefferson; MARIA, Ana. Pesquisa na área de comportamento motor: modelos teóricos, métodos de investigação, instrumentos de análise, desafios, tendências e perspectivas. Revista da Educação Física/UEM. Maringá, v. 21, n. 3, p. 329-380, 3. trim. 2010.
UGRINOWITSCH, Herbert; BENDA, Rodolfo Novellino. Contribuições da Aprendizagem Motora: a prática na intervenção em Educação Física. Rev. bras. Educ. Fís. Esporte, São Paulo, v.25, p.25-35, dez. 2011
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