quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Estruturação do treinamento técnico-tático de voleibol

O processo de estruturação do treinamento técnico-tático pressupõe o estabelecimento de objetivos, a seleção/organização de conteúdos e a elaboração de tarefas que deem conta de desenvolver esses conteúdos ao longo das etapas de formação e/ou durante uma temporada esportiva. 

As tarefas desenvolvidas pelo professor/treinador durante uma aula/treino são as unidades mais básicas do processo de treinamento. Por meio delas, os professores materializam suas intenções para alcançar os objetivos propostos. Para desenhar tarefas representativas, o professor necessita manipular uma série de variáveis pedagógicas, são elas: meios de treinamento, fases de jogo, situações de jogo, tipo de conteúdo e o conteúdo propriamente dito; e organizativas: tempo de duração das tarefas e o tipo de participação dos alunos. No post de hoje, vou me ater às variáveis pedagógicas para a elaboração de tarefas para o treino de voleibol.

Os meios de treinamento são as formas e estratégias utilizadas pelo professor para desenvolver os conteúdos e alcançar os objetivos propostos para a sessão de treinoA diversidade de meios de treinamento disponíveis na atualidade evidencia as concepções metodológicas adotadas ao longo dos anos pelos treinadores de esportes. Ambos os métodos e seus respectivos meios de treinamento tem suas vantagens e desvantagens. Nesse sentido, a diversificação dos mesmos deve ser valorizada pelo professor na elaboração das tarefas.

Os métodos oriundos do princípio analítico-sintético, os chamados métodos tradicionais, utilizam exercícios de valor absoluto e previsíveis, sendo importantes para o desenvolvimento de habilidades básicas e de intimidade do aluno com a bola. São exemplos desses o método analítico,  o método misto e a série de exercícios. Os meios ou estratégias de ensino oriundos desses métodos são os exercícios (analíticos, sincronizados, combinados, circuito etc). 

Já os métodos oriundos do princípio global-funcional utilizam o jogo ou cursos de jogos, oferecendo problemas imprevisíveis e de valor relativo, estimulando a resolução de problemas e a criatividade (GALATTI, 2007). São alguns exemplos o método global e a série de jogos. Como principal meio/estratégia de ensino desses temos o jogo (jogos reduzidos, jogos condicionados, jogo formal, jogo competitivo etc).

As fases de jogo dizem respeito às fases de ataque, de defesa e mista (ataque e defesa concomitantemente). No voleibol, o jogo pode ser dividido em complexo de jogo I (fase de ataque) e complexo de jogo II (fase de defesa). O complexo de jogo I engloba as ações de recepção, levantamento e ataque. Já o complexo de jogo II consiste nas ações de saque, bloqueio e defesa, seguidas pelo levantamento e ataque. Apesar do saque estar dentro do complexo II, por causa da sequência de ações (sacar e entrar na quadra para defender), atualmente ele é considerado a primeira ação ofensiva da equipe. 

É muito comum treinadores privilegiarem uma fase em relação à outra durante o processo de treinamento, principalmente a fase de ataque, pois ela está diretamente relacionada à conquista do ponto. Contudo, é necessário contemplar todas as fases de jogo ao longo do processo de treinamento para que os alunos aprendam a gerir os momentos do jogo e as transições ofensivas e defensivas.

As situações de jogo representam o número de jogadores e os papéis que eles possuem em uma tarefa concreta (relação de oposição [x] ou cooperação [+]: 1x0, 1x1, 1x1+1, 2x0, 2x1, 2x2 etc). Por exemplo, uma tarefa de saque x passe/recepção pode ser descrita como uma situação de jogo 1x1, 1x2, 1x3 etc.  Por sua vez, uma tarefa de saque x passe/recepção + levantamento pode ser descrita como uma situação de jogo 1x1+1, 1x2+1, 1x3+1 etc. Como podemos ver, elas podem ser de igualdade, superioridade ou inferioridade numérica. 

Quanto maior o número de jogadores e de relações de oposição e cooperação, mais complexa é a tarefa. Nesse sentido, deve-se oferecer, ao longo das etapas de formação e/ou durante uma temporada esportiva, situações de jogo diferenciadas aos alunos, visando uma progressão adequada das tarefas e a facilitação da aprendizagem (DALLEGRAVE, 2018). Na iniciação ao voleibol, pode-se priorizar tarefas mais simples por meio de situações de jogo 1x0, 1+1, 1x1, 2x0, 2x1, 2x2 etc enquanto que nas etapas mais avançadas, situações de jogo mais complexas como 1x3, 1x4, 1x5, 1x1+1, 1x2+1, 1x3+1, 3x3, 4x4 e 6x6 podem ser priorizadas. De modo semelhante, durante uma temporada esportiva pode-se começar com situações de jogo menos complexas e avançar para situações de jogo mais complexas conforme se aproximam os períodos competitivos.

Os tipos de conteúdo podem ser descritos em gestos técnico-táticos (ações técnicas individuais e grupais) e condutas tático-técnicas (ações táticas individuais e grupais). No voleibol, os gestos técnico-táticos são os chamados fundamentos técnicos: saque por baixo, toque, manchete, saque por cima, cortada, bloqueio, defesa etc. Já as condutas tático-tecnicas estão relacionadas aos fundamentos e ações de jogo do voleibol: saque, passe/recepção, levantamento, ataque, bloqueio e defesa. 

Todas as variáveis pedagógicas se relacionam entre si durante o processo de planejamento e elaboração das tarefas do treino. Um exemplo é a relação entre as fases do jogo e as situações de jogo. Quando se pretende trabalhar a fase de ataque, pode-se utilizar diversas situações de jogo, desde o 1x0 com o intuito de desenvolver gestos técnico-táticos como o movimento da cortada, até situações de jogo mais complexas como o 1x2+4 (ataque x bloqueio + defesa) com o intuito de trabalhar condutas tático-técnicas, no caso, o ataque se opondo ao bloqueio duplo e a defesa adversária. Se a pretensão é trabalhar a fase mista (ataque e defesa simultaneamente), situações de jogo com igualdade numérica como o 1x1, 2x2, 3x3, 4x4 ou 6x6 podem ser utilizadas.

Por fim, conhecer as variáveis pedagógicas, suas relações e saber manipulá-las pode contribuir para a avaliação e elaboração de tarefas efetivas que contribuam para o processo de estruturação do treinamento técnico-tático

Até uma próxima!

REFERÊNCIAS

DALLEGRAVE, Eduardo José, FOLLE, Alexandra  OLIVEIRA, Vinícius Plentz, NASCIMENTO, Juarez Vieira. Estrutura das tarefas de treinamento em modalidades esportivas coletivas: análise da produção científica. Movimento, Porto Alegre, v. 24, n. 3, p. 827-842, jul./set. de 2018.

GALATTI,  Larissa Rafaela, PAES, Roberto Rodrigues. Pedagogia do esporte e a aplicação das teorias acerca dos jogos esportivos coletivos em escolas de esportes: o caso de um clube privado de Campinas - SP. Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 5, n. 2, p. 31-44, jul./dez. 2007.

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